quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Yan Pei-Ming - Mona Lisa

Eric Fischl: Birth of Love

David Byrne-Balanescu Quartet-Model

Eric Fischl - Ten Breaths: Congress of Wits

Eric Fischl -Ten Breaths: Samaritan

Sophia Andresen : O poema

O poema me levará no tempo
Quando eu já não for eu
E passarei sozinha
Entre as mãos de quem lê

O poema alguém o dirá
Às searas

Sua passagem se confundirá
Com o rumor do mar com o passar do vento

O poema habitará
O espaço mais concreto e mais atento

No ar claro nas tardes transparentes
Suas sílabas redondas
(Ó antigas ó longas
Eternas tardes lisas)

Mesmo que eu morra o poema encontrará
Uma praia onde quebrar as suas ondas

E entre quatro paredes densas
De funda e devorada solidão
Alguém seu próprio ser confundirá
Com o poema no tempo


terça-feira, 29 de setembro de 2009

Lyonel Feininger

Paul Strand - Typewriter Keys, 1916

Friedrich Nietzsche - Ecce Homo

Sim, sei de onde venho!
Insatisfeito com a labareda
Ardo para me consumir.
Aquilo em que toco torna-se luz,
Carvão aquilo que abandono:
Sou certamente labareda.

Friedrich Nietzsche, in "A Gaia Ciência"

Metrópolis (Fritz Lang; música: Michael Nyman, Time Lapse)

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Matsuo Basho - Haiku

Silêncio
As cigarras escutam
O canto das rochas

Kofoed - Melancholy Tree

Edward Hopper

Al Berto - E ao anoitecer

e ao anoitecer adquires nome de ilha ou de vulcão
deixas viver sobre a pele uma criança de lume
e na fria lava da noite ensinas ao corpo
a paciência o amor o abandono das palavras
o silêncio
e a difícil arte da melancolia

Enrique Bunbury - Infinito

domingo, 27 de setembro de 2009

Fiama Hasse Pais Brandão - Às vezes as coisas dentro de nós

O que nos chama para dentro de nós mesmos
é uma vaga de luz, um pavio, uma sombra incerta.
Qualquer coisa que nos muda a escala do olhar
e nos torna piedosos, como quem já tem fé.
Nós que tivemos a vagarosa alegria repartida
pelo movimento, pela forma, pelo nome,
voltamos ao zero irradiante, ao ver
o que foi grande, o que foi pequeno, aliás
o que não tem tamanho, mas está agora
engrandecido dentro do novo olhar.


Para Maria de Lourdes Pintasilgo
em breve homenagem

Bach - Goldberg Variations: Aria (Glenn Gould)

Pamela Golden - Asserting Circumference

Pamela Golden - The Knot

sábado, 26 de setembro de 2009

antonio lopez - el beso

António Ramos Rosa

O que eu digo vacila, o que eu vejo treme.
O que eu não posso dizer ou ver é o que eu digo,
é o que eu vejo, a transparência.

(de "Dinâmica subtil")

Johannes Kahrs


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Johannes Kahrs

Anthony and the Johnsons - Candy Says

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

metamorfose

John Currin - Fishermen

José Eduardo Agualusa - O homem que vinha ao entardecer

Falava com devagar, ajeitando as
palavras. Falava com cuidado,
houvesse lume entre as palavras.

Chegava ao entardecer, os sapatos
cheios de terra vermelha e do perfume
dos matos.

Cumpria rigorosamente os rituais.

Batia primeiro as palmas (junto
ao peito)
Depois falava.
Dos bois, das lavras, das coisas
simples do seu dia-a-dia. E todavia
era tal o mistério das tardes quando
assim falava
que doía.

Paul Wright - Double Vision

The Penguin Cafe Orchestra - Air á Danser

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Craveirinha - Um Homem Nunca Chora

Acreditava naquela história
do homem que nunca chora.
Eu julgava-me um homem.
Na adolescência
meus filmes de aventuras
punham-me muito longe de ser cobarde
na arrogante criancice do herói de ferro.
Agora tremo.
E agora choro.

Como um homem treme.

Como chora um homem!

Kaye Donachie - No! Leave me alone, you impure dream

GiorgioMorandi - Naturamorta (1930)

philip glass - liquid days (Freezing)

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Imogen Cunningham - Frida

Frida Kahlo - Autoretrato

Albano Martins - Pintura

Onde se diz espiga
leia-se narciso.
Ou leia-se jacinto.
Ou leia-se outra flor.
Que pode ser a mesma.

As flores
são formas
de que a pintura se serve
para disfarçar
a natureza. Por isso
é que
no perfil
duma flor
está também pintado
o seu perfume.

Wim Mertens - Struggle for Pleasure

Mueck - Mask II no British Museum

Mueck - Mask II

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Andrés Serrano na colecção Lambert

Andrés Serrano

Sigmar Polke - Primavera

ANTÓNIO MACHADO

Caminhante, são teus rastos
o caminho, e nada mais;
caminhante, não há caminho,
faz-se caminho ao andar.
Ao andar faz-se o caminho,
e ao olhar-se para trás
vê-se a senda que jamais
se há-de voltar a pisar.
Caminhante, não há caminho,
somente sulcos no mar.

Andante of Antonio vivaldi - Yo Yo Ma & Bobby McFerrin

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Edward Weston - Shell

Peter Blake - The Meeting or Have a Nice Day Mr Hockney

Edgar Degas - The Rape

Lisa Gerrard - Come Tenderness

David Salle - Old Bottles

Kaváfis - Quanto puderes

Mesmo que não possas fazer a vida como a queres,
isto ao menos tenta
quanto puderes: não a desbarates
nos muitos contactos do mundo,
na agitação e nas conversas.

Não a desbarates arrastando­‑a,
e mudando­‑a e expondo­‑a
ao quotidiano absurdo
das relações e das companhias
até se tornar um estranho importuno.

domingo, 20 de setembro de 2009

Caetano Veloso - Sonhos

Foto de tamara de lempicka

Tamara DE LEMPICKA - The telephone II

Kaváfis - Segredos

De tudo o que fiz e tudo que disse
não procurem descobrir quem fui.
Havia uma barreira que transformava
minhas ações e meu modo de vida.
Havia uma barreira que me parava
nas muitas vezes em que ia contar.
Das minhas ações mais insignificantes
e meus escritos mais velados –
só de lá me sentirão.
Mas quiçá não valha à pena gastar
tanto cuidado e tanto esforço para me conhecerem.
No futuro – numa sociedade mais perfeita –
algum outro talhado como eu
decerto aparecerá e livremente fará.
(Kaváfis, 2006, 19)

Gotan Project - Confidences

sábado, 19 de setembro de 2009

John Surman - Respiro

Sobre Pedro Saraiva

Pela primeira vez digito um texto no meu blog pois pretendia que apenas funcionasse como um caderno de colagens das coisas que gosto.

Abro apenas uma excepção por um acto de amizade ao Pedro e a sua família.

Conheci o Pedro quando ingressamos os dois nas Belas Artes de Lisboa e por um acaso daqueles felizes fui viver para o Algueirão para casa de meus tios onde o Pedro vivia com os pais. Estamos em 1969, tempo em que os jovens acreditavam na partilha, na entreajuda e na discussão livre das ideias.

Rapidamente, caso raro em mim, ficámos amigos e comecei a ser recebido na casa de seus pais com enorme amizade e consideração. Vindo de um ambiente provinciano foi privilégio ter acesso ao atelier de seu pai mestre Domingos Saraiva que tanto me ensinou, muito mais do que nas Belas Artes de então. Mestre Domingos Saraiva faz este ano o seu centenário, digo faz porque acredito que as pessoas só morrem quando nos esquecemos delas e eu não me esqueço dele – sempre o encarei como um exemplo, principalmente na sua imensa alegria de viver – muito mais jovem do que eu com 18 anos na altura.

Muitas vezes trabalhamos lado a lado trocando ideias ao ponto de Mestre Domingos Saraiva nos ter chamado a atenção que as coisas que fazíamos estavam a ficar muito parecidas. Coisa que ainda hoje acredito não seria bem assim porque ao contrário do Pedro sempre os meus trabalhos exigiam bem mais esforço porque me faltavam os conhecimentos que ele já tinha obtido do pai e tenho menos habilidade manual.

Mas desse tempo também na verdade, apesar destes anos passados, ainda existem vestígios nos dois ao nível das cores que utilizamos.

Assim é-me impossível ter distanciamento para analisar o percurso de Pedro Saraiva…apenas posso afirmar que é uma das pessoas mais dotadas para as Artes Plásticas que encontrei e que será certamente um exemplo para os seus alunos da nossa antiga escola (hoje Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa) onde é hoje professor.

Para terminar não foi por acaso que o meu filho se chama Pedro,

JC

Salteiro - sobre Pedro Saraiva

Sobre o ensino artístico é trivial dizer-se que aprendemos com os professores e com os colegas da nossa geração. O Pedro foi o colega que suportou, durante muitos anos em fins-de-semana contínuos, conversas à volta dos meus desenhos, pinturas e ideias que incansavelmente eu acarretava até ao seu atelier em pastas improvisadas. Foram momentos de grande produtividade e criatividade, num saudável ambiente de partilhas que se prolongavam pela noite dentro. Obrigado Pedro!

Neste momento, e em presença de mais uma deslumbrante exposição de Pedro Saraiva intitulada Gabinete > Codina só sou capaz de manifestar o meu enorme respeito por toda a sua obra e pela coerência de todo o seu processo criativo.

Discreto e simples, mas eficaz na técnica e na comunicação.

Pedro Saraiva - gabinete linares

Pedro Saraiva - gabinete linares

Pedro Saraiva - gabinete codina

Pedro Saraiva - gabinete codina

Pedro Saraiva - gabinete codina

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

April Hickox - Untitled (Charlotte) - Colour Photograph

shane macgowan & nick cave - what a wonderful world

Robert Mapplethorpe - Flowers7

MAGGIE HASBROUCK - ACID GREEN PARROT TULIP - PHOTOENCAUSTIC

R.G. - Manifesto Surreal

Flor
Que desejas amor,
Deixa-te beijar
Pela abelha melosa…
Pela borboleta graciosa…
Pela ave beija-flor…
Pelo vento sonhador…
Ou até pelo morcego assustador!
Deixa o teu pólen viajar,
Solta o néctar divinal!
Queremos tua essência fatal,
A fusão do animal com o vegetal,
O sangue e a seiva misturar.
Queremos reinos amalgamados.
Vamos ainda seduzir o mineral…
Talvez o brilhante diamante…
Certamente um excelente amante.
Queremos beijos encarnados,
Polinizados, fossilizados!
Flor que tens estigma,
Deixa-nos desvendar teu enigma…
Queremos recriar a vida,
Uma Natureza sobrenatural!

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Rainer Maria Rilke - SOLIDÃO

A solidão é como uma chuva.
Ergue-se do mar ao encontro das noites;
de planícies distantes e remotas
sobe ao céu, que sempre a guarda.
E do céu tomba sobre a cidade.


Cai como chuva nas horas ambíguas,
quando todas as vielas se voltam para a manhã,
e quando os corpos, que nada encontraram,
desiludidos e tristes se separam;
e quando aqueles que se odeiam
têm de dormir juntos na mesma cama:

então, a solidão vai com os rios...

Georgia O'Keeffe - Oriental Poppies

Alfred Stieglitz - Georgia O' Keeffe mãos

EGBERTO GISMONTI - PALHAÇO

Rodrigo Leao - VOLTAR

Robert Mapplethorpe

Arthur Rimbaud

Escrevia silêncios, noites, anotava o inexprimível.
Fixava vertigens.
Criei todas as festas, todos os triunfos, todos os dramas.
Tentei inventar novas flores, novos astros, novas carnes, novos idiomas.

Neo Rauch - Pintura

John Williams - Cavatina (Live, with SKY)

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Fátima Condeço - as asas que nao podias voar

Fátima Condeço - Os anjos não têm costas

Gotan Project - La Revancha Del Tango Live

Edward Steichen - Garbo

Pablo Neruda - Poema Sê

Se não puderes ser um pinheiro, no topo de uma colina,
Sê um arbusto no vale mas sê
O melhor arbusto à margem do regato.
Sê um ramo, se não puderes ser uma árvore.
Se não puderes ser uma ramo, sê um pouco de relva
E dá alegria a algum caminho.

Se não puderes ser uma estrada,
Sê apenas uma senda,
Se não puderes ser o Sol, sê uma estrela.
Não é pelo tamanho que terás êxito ou fracasso...
Mas sê o melhor no que quer que sejas.

karin kneffe - No title, 2005, Óleo sobre tela, 130 x 170 cm

karin kneffel -No title, 2005, Óleo sobre tela, 100 x 190 cm.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

miquel barceló em frente da "la solitude organisative"

Miguel Barceló

Omar Peréz - A VITÓRIA DOS DESOBEDIENTES

Na multidão
um homem pontapeou disfarçadamente uma pomba
muitas vezes antes de recolhê-la.
Há uma só vida e envolvê-la-emos com escamas
há uma só vida e cobri-la-emos com as palavras de outros
apalpá-la-emos dissimuladamente várias vezes
antes de decidir que a queremos.

Luc Tuymans - atelier

Luc Tuymans - The Secretary of State

NATHALIE MARANDA - SOEUR FORET 301205 - MIXED MEDIA ON PANEL